segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Ai, ai, se a Pipoca fala de resorts eu também quero, era só o que mais faltava.

Isto dos resorts phynos, de cinco estrelas, all included, localizados em países phynamente classificados como “emergentes” ou “de economia em desenvolvimento” tinha mais piada se houvesse um túnel de ligação entre o aeroporto e as ditas bolhas paradisíacas. É que assim uma pessoa entrava em modo autómata no transfer no aeroporto e não via nada de menos belo até entrar nas águas quentes como o caldo da praia privada do hotel. Mas não… Até chegar ao paraíso vemos aquilo que não queremos ver. Vemos casas miseráveis. Vemos pobreza e gente suja. “Oh qui carai, e foi para ver esta miséria que eu me endividei?”, pensará o "resortiano".

Para mim, o que se passa nesses resorts, nesses tais países “emergentes”, choca-me. Choca-me a desigualdade cultural e social. Choca-me o coabitar e o interagir desconstrangido e descomprometido do turista “desenvolvido” com o local “emergente” (e a viver em condições miseráveis e sub-limiares da dignidade, já agora). Choca-me o desperdício. Desperdício esse que nem sempre parte do cliente, já que há por parte de quem presta o serviço uma certa gala nele. Não há cá toalhas penduradas para serem reutilizadas. Trocam-se as toalhas e já está, estejam estas penduradas, no chão ou pelo caminho. Água a três quartos deixada no quarto? Troca-se a dita garrafa por outra fechada e não se fala mais nisso. Deixar as luzes apagadas quando se deixa o quarto? É um conceito desconhecido para o staff. Tens um prato com bolinhos, pousa-lo e distrais-te, meio minuto, a conversar com alguém? Zau! Já foste! Bolinhos com os porcos. 

Na República Dominicana há umas autoestradas muito jeitosas. Usadas por transfers para turistas, com preços proibitivos para os locais que andam nas bermas, de mota, aos três de cada vez, a favor e contramão, mas sempre sem capacete (até perguntava a brincar se seria proibido já que das dezenas (centenas?) de motas que vi só em duas os condutores o usavam). Choca-me que a cem ou duzentos metros da bolha paradisíaca as crianças andem descalças e sujas. Crianças essas que não dispõe de um sistema de educação ou de saúde minimamente digno ou capaz. As frutas da bolha paradisíaca, tal como os legumes, não têm sabor. Nem cor. Eram claramente importadas e amadurecidas numa qualquer câmara frigorífica. Nem imagino a que preços chegarão aos locais coisas aparentemente tão vulgares como tomates ou melancias. Se chegarem, claro. A República Dominicana produz arroz e açúcar. Bananas e café. Fora isso, chapéu! E mesmo isso… Os pequenos produtores sofrem uma qualquer alteração de humores do São Pedro e… Chapéu! O quê? Seguros para proteção pelo clima? Eeeerrr… Pois… Chapéu!

Apesar de tudo, quem vive do turismo não olha a meios para disso tirar partido. Nunca em minha vida me senti tão explorada. Preços para turista, são preços para turista em todo o Mundo, mas os que ali vi foram exorbitantes. Quão exorbitantes? No aeroporto de Santo Domingo quinze dólares por uma tosta mista de exorbitância. Por momentos senti-me na Noruega ou na Dinamarca. Mesmo na rua (ali colado à bolha, que em boa verdade não conheci mais nada)… Um íman ranhoso para o frigorífico? Seis dólares e não se fala mais no assunto.

É claro que em contraposição com o Haiti, os outros condóminos da Ilha Espanhola e onde nada há além de pobreza, podemos sempre pensar que, enfim, encontraram  os dominicanos a rampa de lançamento neste tipo de turismo. Mas não… Ou, por outra, dificilmente. O fosso é enorme. E os pobres são muitos e vivem miseravelmente. Ou há SUVs e Porches ou há carros ferrugentos e a cair aos pedaços, literalmente.


Não sei qual é a solução. Nem tampouco sei se haverá solução (a curto prazo pelo menos garantidamente que não). Eu só sei que tendo eu visto e sentido e cheirado aquilo que eu vi, senti e cheirei fora da bolha, não me souberam a paz de espírito as Margaritas lá included.

14 comentários:

  1. Depois de ter ido a 63 países, sei que não será nenhum record mas também não é nada mau, continuo sem perceber este tipo de férias, será pelos preços atrativos? Pelas praias paradisíacas? Será que isso chega? E conhecer o pais? Perceber a cultura, não? Nunca estive na RD mas estive em Havana este ano, porque todos dizem que "vai acabar", fugi de varadero e dos caios e instalei-me numa casa particular,

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    1. A restante é simples. A sua maneira de pensar não é nenhuma verdade absoluta e, como tal, existem outras diferentes. Se uma está mais correta que outra? Não.

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    2. Para quem tem crianças pequenas este sistema de tudo incluído é muito simpático. Nestes sítios também há actividades específicas para elas, as praias e piscinas são muito controladas pelo que dá para os pais descansarem um pouco. Coisa que de outra forma, enfim... Em ferias só para adultos... Pois, também não é para mim mas reconheço que para quem queira só descansar e relaxar dificilmente encontrará melhor já que não precisa de se preocupar com nada.
      A
      (Mas o meu ponto não era exactamente este...)

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  2. O comentário anterior foi incompleto... Cuba tem a "curiosidade" de ter 2 mundos, a começar pelas 2 moedas, senti que estive "ligeiramente" mais perto da (dura) realidade mas mesmo assim andei numa "bolha" e para quem quer ir antes que acabe.... Tenho uma má notícia, Havana já acabou.

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  3. Nunca tais férias me passaram pela cabeça, até este ano. Dois filhos. E de repente o tudo incluído e praia e mar e bolha ... obrigada pelo texto. Vou voltar ao meu registo de férias. ;)

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    1. :) também mudei de ideias desde que fui mãe... Mas, e à parte de tudo que falei no post, nem me passaria pela cabeça sujeita-los a viagens de dez horas, escalas, trazê-los a reboque por aeroportos por uma semana de férias. È que nem pensar... (Já dar um saltinho ali às ilhas Espanholas... ;))

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  4. Pipocante Irrelevante Delirante13 de setembro de 2016 às 19:15

    A caríssima precisa de leitores novos...
    Então ninguém puxa do argumento de que em Portugal também há pobreza? E de que o turista dá emprego aos nativos, reduzindo assim a miséria?
    Homessa!

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    1. Já viu a minha vida, PID? O dia todo com vontade de puxar a cartada do turismo sustentável e nada... Já não se pode confiar em ninguém, é o que lhe digo...

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  5. És masé uma invejosa tu!! :p (tou a brincar naturalmente)

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    1. A brincar que o digas... Dava-me com aquela vida, dava... ;p

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  6. Eu também concordo que a NM precisa de leitores novos, mas não pelos mesmos motivos que o PID aponta. Um post tão bom e perdeu-se uma excelente oportunidade para se fazer aqui um debate sério e interessante sobre o tema.

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    1. Por acaso é verdade que este post é dos mais lidos que tenho e que costumo ter mais comentários.
      A questão é que é de difícil debate. O que é que um turista estrangeiro pode fazer? Decidir se contribui ou não para este tipo de turismo, não é? Mas mesmo relativamente a isso acredito que as pessoas tenham mixed feelings. Se calhar se não fosse isto do "all included" as pessoas não se deslocavam lá e uma grande percentagem de locais trabalha nos tais resorts... Não é assunto fácil de debater principalmente se tivermos em conta que falamos de países com democracias muito débeis. Os próprios locais só têm memória de tempos piores, não têm o diatanciamento que nós temos. Apesar de tudo, uma fatia substancial da população tem agora um emprego seguro (de segurança física mesmo) e limpo e digno.
      O que tem de haver por parte do governo desses países é uma preocupação em manter um turismo sustentável para o país e que dele benefecie a generalidade da população. Coisa que não acontece, porque os níveis de corrupção são estratosféricos, as democracias são muito débeis e a generalidade dos populares é pouco instruída, crítica ou exigente (coisa que não acontece no Brasil ou na Argentina, por exemplo). Com o passar dos anos e o aumento da educação acredito que a passividade diminua e as coisas mudem.
      Enfim, só para dizer que compreendo os poucos comentários já que é um tema de difícil discussão.

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  7. Se escrevesse que a choca existirem realidades como a que viu na RD e a forma como os locais vivem, entenderia e penso que qualquer pessoa com o mínimo de empatia pelo ser humano também entende. Agora o que não consigo compreender é por que motivo se foca tanto no contraste entre o luxo dos resorts e o dia-a-dia da população: que ideia tinha da RD, nunca ouviu falar/pesquisou antes de viajar para lá? Já imaginou que o luxo dos resorts é pago pelos turistas, e que esse dinheiro vai beneficiar a economia do país, os impostos vão melhorar os serviços públicos do país... Já pensou que sem os luxuosos resorts e sem os turistas/privilegiados a situação do país seria ainda pior? E com não entende as diferenças dos preços para turistas vs preços para locais (não é assim no mundo inteiro?). Eu quando viajo quero conhecer o país como ele é, ou será que se for p. ex ao Brasil é melhor pedir para arredarem as favelas para eu passar? Ou deixar de viajar porque o mundo não é como eu queria que fosse e assim é melhor nem ver? Nem é preciso ir longe, basta percorrer as ruas de uma cidade portuguesa à noite e ver a quantidade de pessoas a dormir nas ruas - é mais grave se for à porta do Ritz?

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    1. Olhe Ana Duarte, estava capaz de lhe explicar que não escolhi ir à RD, fui em trabalho (sim há vidas piores), também estava capaz de apostar que se for à Somália e vir aquelas crianças sente que é como levar um murro no estomago apesar de saber desde os doze anos o que lá se passa, é aquilo de olhos que não veem, coração que não sente. Também estava capaz de lhe explicar que o que me choca não é o "luxo" é o desperdício derivado do "all included", é a insustentabilidade daquele tipo de turismo. Também era capaz de lhe dizer que tirando os empregados dos tais resorts que são pagos com umas cascas de alho, a população em geral beneficia zero com este tipo de turismo, só perde porque lhe sugam os recursos. Até estava capaz de lhe explicar muita coisa (que por acaso até já referi em comentários anteriores), mas a Ana Duarte já decidiu que eu era ignorante e detentora de parcos recursos intelectuais, e como eu bem sei o desgastante que é discutir com estúpidos vou poupá-la à maçada. Não precisa de agradecer.

      (Razão tinha o PID, os argumentos poucochinhos podiam tardar mas iam aparecer...)

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